Claro S.A. é condenada por violação de dados pessoais

Claro S.A. é condenada por violação de dados pessoais

Por Fabio Vieira e Gabriela Tchalian

 

Embora ainda esteja em formação, a jurisprudência sobre privacidade e proteção de dados passa a contar com novo precedente: a Apelação Cível nº 1010253-75.2020.8.26.0019, julgada em 1.2.2022, na Comarca de Americana, São Paulo.

A parte autora (“Autora”) é pessoa física, cujo nome não será revelado para preservação da identidade, bem como por correr o processo em segredo de justiça. Refere-se a relação de consumo, figurando a Claro S.A. (“Claro”) como ré da ação.

Alegou a Autora que, no dia 16.9.2020, pleiteou à Claro o sigilo de suas informações e aplicação do procedimento de “verificação em duas etapas”. Tal procedimento consiste em demandar informações que somente as partes teriam acesso para validar a identidade da Autora em contatos com a empresa.

No entanto, no dia 8.10.2020, a Claro foi contatada por um terceiro, que obteve a fatura de consumo da Autora, na qual constavam seus dados cadastrais.

Em razão dessa falha, a Autora informou que foi procurada por genitor de seu ex-companheiro na própria residência. Relevante apontar que, contra referido ex-companheiro, a Autora detém medida protetiva.

Por fim, alegou que resposta da Claro enviada à Agência Nacional de Telecomunicações (“ANATEL”) a respeito do ocorrido é reconhecimento do erro na prestação do serviço e demandou indenização no valor mínimo de 50 (cinquenta) salários-mínimos por danos morais.

Em contestação, a Claro argumentou que (i) não fora comprovada a utilização indevida dos dados pessoais da Autora nem o acesso por seu ex-companheiro; (ii) a operadora preza pelo atendimento de qualidade e segurança de informações de seus clientes; (iii) a alegação de vazamento de dados seria hipotética, pautada em meras suposições; (iv) sua própria resposta à ANATEL não configuraria confissão; e (v) não haveria dano a indenizar.

No dia 18.5.2021, foi proferida sentença pelo juiz de primeiro grau Gilberto Vasconcelos Pereira Neto, que julgou improcedente a ação indenizatória e condenou a Autora ao pagamento de custas, despesas processuais e honorários advocatícios.

A Autora apelou, tendo seu recurso conhecido pela 37ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, sob a relatoria do Desembargador José Wagner de Oliveira Melatto Peixoto.

Seguindo o voto do relator, deu-se provimento parcial ao recurso.

Entendeu o relator que caberia à Claro averiguar e provar a identidade de quem a contatou no dia 8.10.2020, por se tratar de relação de consumo, com base nos artigos 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor; 373, II, do Código de Processo Civil; e 42, §2º, da Lei Geral de Proteção de Dados (“LGPD”). Contudo, a empresa não se desincumbiu do ônus.

Determinou, portanto, estar configurada a violação do sigilo dos dados pessoais da Autora, em descumprimento do artigo 2º, I, da LGPD, e prestação de serviço defeituoso.

Por consequência, entendeu ser cabível a indenização, definida com base em (i) circunstâncias e extensão do dano; (ii) princípios do desestímulo, proporcionalidade e razoabilidade; (iii) proibição do enriquecimento ilícito.

A Claro ainda pode vir a responder perante a Fundação de Proteção e Defesa do Consumidor de São Paulo (“Procon-SP”) e perante a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (“ANPD”) pelo mesmo fato.

Chama a atenção que a proteção de dados foi concedida mesmo em se tratando apenas de dados cadastrais, desviando-se da preocupante tendência de alguns precedentes emitidos no ano de 2020 que consideravam existir dano moral apenas no caso de violação de dados pessoais sensíveis.

Este material tem caráter meramente informativo e não deve ser utilizado isoladamente para a tomada de decisões. Aconselhamento legal específico poderá ser prestado por um dos nossos advogados. Direitos autorais são reservados ao Kestener & Vieira Advogados.

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